Vi-te no cinema, mal entraste. O ar desengonçado, cabelo desgrenhado, óculos à intelectual. Prendeste-me a atenção imediatamente. Os nossos olhares cruzaram-se e eu soube. Sentaste-te a meu lado, inquieto. O filme a puxar ao sentimento, as lágrimas a caírem soltas e o desconforto da situação. Senti que me observavas e eu retribuía.
Eu imaginei o teu nome e o que fazias. Tocavas violoncelo na orquestra clássica da cidade. Eras tímido à primeira vista mas muito seguro de si próprio ao mesmo tempo. Fechado, quase impenetrável, misterioso. Atencioso mas não muito afectuoso. Simpático e sisudo. Eloquente mas pouco comunicativo. Sensível e racional. Forte e de difícil acesso mas um amigo para sempre.
Apreciavas as coisas boas da vida e valorizavas os pequenos prazeres que ela proporciona.
Tal como eu, gostavas de conhecer pessoas, de conversar até amanhecer, de vaguear perdido e ser achado por qualquer pessoa que pudesse passar e parar.
Adoravas música! Fosse ela de que género fosse. Éramos capaz de passar horas a falar sobre ela. Mas não gostavas só de música. Deleitavas-te com todos os tipos de arte. Talvez fosse handicap profissão. Afinal, eras um artista.
Quando a sessão terminou, eu já sabia tudo sobre ti. Tu pediste licença e saíste.
Eu disse-te adeus para sempre. Tinha sido um prazer conhecer-te, convencida que nunca mais nos iríamos cruzar. Talvez mesmo nem existisses.
Mas a vida tem destas coisas…
Hoje sei que és real mas não para mim. Para mim foste e serás uma doce ilusão que eu fiz questão de alimentar até se tornar insuportavelmente real. Aí, perdeu o encanto. Perdeu-se a ilusão e o sonho.
Passaste a fazer parte do passado.
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